SENTENÇA
Vistos, etc...
MARIA* ingressou com AÇÃO DE OBRIGAÇÃO COM FAZER contra a OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE*, pretendendo a cobertura de radioterapia por intensidade modulada, tratamento indicado por seu médico assistente e cuja cobertura fora negada pela operadora ré.
A peça vestibular veio acompanhada dos documentos de fls. 28/114, inclusive com o pagamento das custas, fls. 115.
Conclusos os autos, o então presidente do feito deferiu a liminar para antecipar os efeitos da tutela e mandar que a operadora realizasse o tratamento pedido, expedindo-se, para tanto, a missiva intimatória e citatória, com o consequente oferecimento da resposta contestatória de fls. 121/139, que veio acompanhada dos documentos de fls. 140/160.
Na peça de bloqueio, diz a ré que opera o plano de saúde na modalidade de autogestão, salientando que a recusa da cobertura tem amparo no art. 10, IX, da Lei de Plano de Saúde, pois o tratamento não consta do rol de cobertura obrigatória, invocando, ainda, a regulação técnica segundo a qual o tipo de tratamento só está previsto para os casos de câncer do sistema nervoso central ou cabeça e pescoço, pugnando pela improcedência do pedido.
Sobre a contestação ofertada, a parte autora disse em réplica, fls. 166/176, peça que veio acompanhada dos documentos de fls. 177/339.
Designada a audiência de que trata o art. 331 do revogado Código de Processo Civil, assentei naquela oportunidade o feito comportava julgamento no estado em que se encontrava e a parte ré juntou nova resposta contestatória, fls. 360/381, acompanhada dos documentos de fls. 382/416.
Em seguida, o patrono da demandante comunicou o óbito da sua cliente, fls. 418, petição que veio instruída com a certidão de óbito de fls. 419, razão pela qual suspendi o feito para a habilitação do espólio, havida através da petição de fls. 423, que veio acompanhada do documento de fls. 424, intimando-se, então, os litigantes para se manifestarem sobre o desejo de produzir mais provas, dizendo a parte demandante não pretender e a ré, quedando-se inerte.
É o que havia de importante a relatar. Decido.
O feito comporta julgamento no estado em que se encontra porque a matéria não necessita de dilação probatória, sendo certo que a autora aderiu ao plano de saúde operado pela autogestora demandada no dia 16/04/2005, conforme documento de fls. 30, impondo-se apenas saber se a demandada está obrigada a cobrir o tratamento da radioterapia por intensidade modulada, incontroversamente negada sob a alegação de não constar do rol de procedimentos editado pela ANS.
A parte autora sustentou na peça vestibular que o regulamento da operadora demandada prevê a cobertura do tratamento pedido, louvando-se do art. 26, §4º, III.
De fato, como sustentado na peça vestibular, o regulamento do plano de saúde estabelece que não haverá cobrança de coparticipação do beneficiário na hipótese de a despesa tratar de radioterapia.
O art. 10 do regulamento remete o beneficiário para uma tabela geral de auxílios, não existindo regra regulamentar que claramente estabeleça a cobertura assistencial como sendo aquela editada pela ANS.
Assim, existindo no regulamento dispositivo que autoriza afirmar haver cobertura das despesas com radioterapia sem coparticipação do beneficiário, e não havendo no texto regra que restrinja a cobertura assistencial ao regulamento da ANS, impõe-se reconhecer a presença de dúvida sobre os limites assistenciais, devendo a interpretação utilizada ser aquela que mais favorece aquele que adere ao contrato.
No caso, a boa-fé objetivamente considerada autoriza afirmar que o beneficiário tem a confiança de obter o tratamento radioterápico de toda e qualquer espécie, inclusive aquela espécie denominada “radioterapia de intensidade modulada”.
Não é demais argumentar, em favor da pretensão autoral, o fato de a divisão de regulação técnica ter aprovado, em 30/12/2011, os critérios de autorização e pagamento das despesas relacionadas à radioterapia, inclusive a de intensidade modulada, o que significa dizer que tal espécie de procedimento faz parte da tabela geral de auxílios (TGA), sendo certo que o documento técnico restringe a utilização da terapia para tumores do sistema do nervoso central ou cabeça e pescoço, limitação indevida quando o médico assistente entende ser aquele método o mais adequado para outra hipóteses, porque dele é o risco do sucesso ou insucesso do caminho a ser perseguido para a cura do enfermo.
O Código Civil estabelece, no art. 422, que os contratantes devem observar conduta ética de lealdade e boa-fé na formação e na execução do contrato; no caso, os regulamentos do plano de saúde, como dito, não evidenciam, de maneira expressa, a cobertura assistencial dentro dos limites mínimos estabelecidos pela ANS e o texto negocial associado ao parecer técnico de regulação autoriza reconhecer a cobertura para o tratamento pedido.
O artigo 423, do Código Civil, por sua vez, dispõe que quando houver no contrato de adesão cláusulas que gerem dúvida quanto à sua interpretação, será adotada a mais favorável ao aderente; reconhecida, portanto, a existência de dúvida no contrato firmado entre as partes, conforme alhures referido, reputo devida a cobertura do procedimento indicado a inicial, justamente por ser a interpretação que mais favorece ao beneficiário que aderiu ao contrato de prestação de serviço suplementar à saúde.
Pelo exposto, com base nos artigos referidos, aos quais acresço os artigos 85 e 487, I, CPC, JULGO PROCEDENTE a pretensão autoral para, confirmando-se a tutela antecipada deferida, condenar a ré a cobrir o tratamento descrito na inicial. Condeno a demandada, ainda, no pagamento de honorários de sucumbência, que ora fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa e na devolução do valor das custas atualizadas desde a data do desembolso, ambos pela tabela do ENCOGE.
P.R.I. e, após o trânsito em julgado, arquivem-se.